Arquivo do mês: dezembro 2009

Um ano em dez posts. Feliz 2010!

É, 2009 acabou. No que diz respeito ao Webmanario, foi um ano intenso: mais uma vez, quem acompanhou as discussões sobre jornalismo por aqui encontrou pelo menos um texto novo todos os dias, o que desde sempre foi um propósito deste trabalho _afinal de contas, se está na web, atualize ou morra.

E quais foram as discussões mais apreciadas e que contaram com maior participação de vocês em 2009? Fiz a seleção abaixo com base em dados estatísticos de acesso ao site. Espero que aproveite nossa retrospectiva e que, em 2010, dê as caras por aqui colaborando com novos debates sobre essa profissão que passa por tantas transformações.

Feliz 2010!

1. Um trambolho chamado ‘máquina da UPI’ – Aqui eu contei os primórdios da transmissão de fotos com uma geringonça demorada e barulhenta. Provocou inesperado buzz na rede

2. O fim do diploma e o começo de outro jornalismo – Como não poderia deixar de ser, o debate que se seguiu ao fim da obrigatoridade da formação específica para se exercer a profissão

3.Phelps, maconha e o plantão de domingo – O supernadador foi flagrado em impedimento justamente no meu plantão (e contei como foi a decisão de publicar a notícia)

4. Cenas trágicas da última edição de um jornal – O triste fim do Rocky Mountain News, centenário jornal americano que desapareceu em 2009

5. A ética jornalística e as filhas góticas de Zapatero – Esse post é uma surpresa e foi bombado porque o assunto virou pop na Espanha (graças ao visual, digamos, demodê das filhas do premiê)

6. Esso rouba nome de jornalista para promover campanha jabazeira – Ocorreu com Juca Kfouri, mas poderia ter sido com você

7. O Google Wave e as mudanças no jornalismo – Uma das revoluções do ano e sua experiência prática na revista Época

8. A capa certa na banca de jornal errada – Mais uma vez, post inflado artificialmente. Agora, por fãs de MacIntosh embriagados pelo constrangimento que uma capa de revista submeteu os PCs

9. Aeroportos querem banir revista Caras da sala de embarque – Essa foi boa, e foi um furo: publicação estava dando facas e garfos de brinde (e aviões tiveram de voltar ao pátio por causa dessas ‘armas’)

10. A maior contribuição ao jornalismo visual completa 8 anos – O trabalho multimídia da MSNBC sobre o 11 de Setembro que viraria padrão na internet

Previsões para 2010: o ano em que cobraremos por conteúdo

2010 será, finalmente, o ano em que cobraremos por conteúdo?

Para alguns magnatas de mídia, certamente. A cruzada pelo pagamento por consumo de notícias, como se notícia fosse, por exemplo, música, move os últimos anos da vida de Rupert Murdoch _que rompeu com o Google e, mediante um acordo com o Bing, não vai sumir totalmente das máquinas de busca.

Richard Pérez-Peña faz, no NYT, uma análise coerente da escalada de acontecimentos que levou à drástica decisão de setores do mainstream (como o próprio NYT) a dar um tiro no pé e passar a cobrar pelo que os internautas sempre tiveram (e terão) de graça.

A constatação de especialistas ouvidos na matéria do NYT casa com a percepção geral de que conteúdo muito específico, como o econômico, o único que as pessoas não querem compartilhar, ou de nicho são capazes de prosperar num ambiente de payperview. Sites noticiosos generalistas, porém, dificilmente poderão se manter se adotarem a proteção do paredão pago.

Minha única dúvida é saber quanto vai custar, para a grande mídia, cobrar por conteúdo jornalístico. Será bem caro e sugere, de antemão, que haverá passo atrás.

É pagar pra ver.

Previsões para 2010: esqueça o diploma de jornalismo

Uma informação a quem carrega, para 2010, esperanças no Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que restitui a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão: o governo Lula já trabalha com a informação de que o contrabando será vetado liminarmente pelo mesmo STF que já havia expurgado essa herança maldita.

A estratégia desse povo agora, e sob a luz da Confecom, aquela aberração, é conseguir uma espécie de casuísmo no Ministério do Trabalho, onde se registrariam os profissionais de jornalismo, o que possibilitaria, claro, a realização dos desejos persecutórios do grupo político que agora está no poder e que, estivesse na oposição, combateria até a morte essa espécie de ditadura mal posta e mal discutida.

O público, e o caldeirão da conversação, ainda é o melhor tribunal da mídia (formal ou social). E há ainda os códigos Civil e Penal, para punir os abusos. Não precisa mais. Tenha caráter, e isso basta.

Mídia social para pequenos jornais, eis a questão

Uma inquietação entre colegas que trabalham em pequenas redações é como dar conta de tantas “obrigações” on-line, sobretudo as que dizem respeito a redes sociais.

É exatamente o tema da conversa entre Stephanie Romanski e Mark Coddington. Eles trabalham no Grand Island Independent, de Nebraska (EUA), jornal que possui cinco repórteres e quatro redatores. Árdua, portanto, a tarefa de manter a conversação em bom nível e frequência desejável.

Ela conta que sempre foi internauta de primeira hora. Então, é claro, isso a ajudou a elaborar estratégias para transformar o jornal, como notou Mark, numa pessoa, pelo menos nas redes sociais.

O Twitter concentra as atenções desses dois entusiastas da mídia social e, no bate-papo, que dura cerca de meia hora, eles falam sobre experiências (boas e ruins) que testaram num jornal bem pequeno _e que nem por isso deve deixar o barco do diálogo com a audiência passar.

Entender que pequenos jornais têm públicos específicos é a chave do processo. Ficar se lamentando sobre tamanho da equipe abre o caminho do fracasso.

“O valor da mídia social é bem maior que o dinheiro”, diz, com razão, Stephanie. Ali está um público que quer conversar, participar e que pode ser conquistado com medidas recíprocas. Pense nisso.

Previsões para a mídia social em 2010

O documento colaborativo “Previsões para a Mídia Social em 2010“, em espanhol, já está na rede e pode ser acessado e atualizado por qualquer um (na verdade, ele será revisto e atualizado depois, incluindo a colaboração virtual).

Eu, assim como você, tenho uma série de palpites sobre o que vem por aí, mas nessas horas ajo como meu mestre Manuel Castells, que diz não fazer previsões porque sempre se equivoca.

Mas dei um pulo ali e as contribuições são bem interessantes _há uma grande aposta em novos usos para o vídeo, por exemplo. Vale uma passada e, se a empolgação for grande, até uns pitacos.

Retratos de 2009: celular impulsiona o jornalismo na África

Esta notícia confirma outra tendência de 2009: os dispositivos móveis se converteram na principal forma de acesso à internet (consequentemente, de envio de notícias) em países em desenvolvimento.

Jacinto Lajas discorre com propriedade sobre o que está acontecendo agora mesmo na África, continente em que acesso discado é realidade, e banda larga, um luxo.

O texto elenca alguns projetos colaborativos importantes que estão em curso, e incensa o Ushahidi _agregador de conteúdo cidadão com ênfase na mobilidade.

A rede celular, mais do que qualquer outra coisa, está incluindo as pessoas nas redes digitais. E acelerando processos de comunicação que, no jornalismo, são bem-vindos e determinantes para a democratização do exercício da função.

Não há mais jornalistas, apenas cidadãos

A corte suprema do Canadá tomou uma decisão histórica nesta semana: basicamente, não há jornalistas, apenas cidadãos.

Os magistrados de lá igualaram (finalmente alguém se tocou) imprensa tradicional e a pessoa que recorre a blogs, SMS, Twitter, o que for, para divulgar uma informação, definindo apenas que é preciso provar que todos os esforços foram feitos no sentido de publicar o que pôde ser verificado como verdadeiro.

É a tese do “jornalismo responsável”, seja ele praticado por quem for. Aquela minha velha cantilena de que “apurar/difundir/analisar informação é direito fundamental da pessoa”, desde que dentro do limite do verificável.

Uma boa notícia no epílogo de 2009.

Foto da redação vazia no NYT: passaralho ou manipulação?

O The Nytpicker é um blog que sempre traz informações de insiders sobre o The New York Times, o jornal que todo mundo quer saber como funciona no duro _ou seja, nas internas.

A foto de uma redação vazia às 21h, que o blog tenta relacionar a mais um passaralho ocorrido recentemente no jornal, está provocando uma enorme polêmica por lá. Há quem diga que se trata da editoria de variedades, que não trabalha nesse horário.

Enfim…

Índios mapuches fazem seu próprio jornalismo no Chile

Jornalismo hiperlocal. Para uma comunidade específica. Falando inclusive em sua própria língua.

É a proposta do Azkintuwe, o jornal/site/agência de notícias da comunidade Mapuche, o principal povo indígena do Chile.

Para ver e aprender.

Wikipedia: ‘é um contrasenso acreditar que um projeto on-line pode superar questões de disputas de poder’

Minha conversa nesta semana é com Carlos d’Andrea, jornalista graduado pela UFMG, especialista em Gestão Estratégica da Informação e mestre em Ciência da Informação pela ECI/UFMG, além de coordenador do curso de Jornalismo da UFV, em Viçosa (MG).

O tema, a Wikipedia, umas das especialidades dele. E minha eterna preocupação: afinal, existe democracia dentro de um projeto colaborativo tão ambicioso e grande como o de Jimmy Wales?

Quem não é nativo digital tem uma dificuldade flagrante em compreender o processo de construção de reputação em projetos colaborativos de massa, como a Wikipedia. Não entende-se, por exemplo, que a frequência de participação dá muito mais pontos que a qualidade dela _ainda mais se for única. A Wikipedia é realmente um ambiente democrático e aberto à edição da inteligência coletiva? Quem manda na Wikipedia?
Acho que temos várias questões nesta pergunta. Há sim uma dificuldade não só dos usuários que não são nativos digitais, mas também dos que estão “presos” aos modelos tradicionais de produção de conteúdo e mesmo dos que associam a idéia de colaboração à simples criação de um espaço pessoal para publicação – blogs, por exemplo. Na Wikipédia, um espaço em que todos atuam no mesmo conteúdo em busca de um consenso provisório (e improvável) sobre um tema, torna-se indispensável o aperfeiçoamento de mecanismos de reputação para hierarquizar minimamente a participação do público.

A mensuração poderia ser mais quali do que quantitativa? É improvável que desse certo. Sabemos que mensurar qualidade de uma informação, ou de uma ação, é algo tão subjetivo que inviabilizaria o funcionamento do projeto na escala em que ele se propõe. Além do mais, a Wikipédia está baseada numa lógica operacional e ideológica calcada no TRABALHO. Mais do que gênios ou doutores, o projeto espera atrair operários, isto é, pessoas a se debruçar sobre ele de forma exaustiva.

Dizer se a Wikipedia é ou não um “ambiente democrático e aberto à edição da inteligência coletiva” é complicado. Em grande parte, é, mas é tão baseado em regras e hierarquias internas que passa a ser uma “democracia” que poucos compreendem e/ou têm a disposição de se engajar. É como se tantos fossem analfabetos que as eleições ficam sob suspeita…

Seria fácil dizer que quem manda na Wikipédia são os administradores, que são usuários que foram eleitos e possuem prerrogatigas técnicas. Mas talvez mais do que eles o que determina os rumos do projeto é uma forte vinculação ideológica com a proposta seguida por eles e a rígida estrutura organizacional que, ainda que voluntária e parcialmente descentralizada, norteia os editores.

Pedro Doria, diretor de mídias digitais do Grupo Estado, imagina o modelo de “matérias abertas” para o jornalismo do futuro/presente. Nesse caso, não com a participação direta do público, mas de jornalistas profissionais _pelo menos num primeiro momento. Você vê alguma esperança para o wikijornalismo prosperar, já que a própria Wikipedia é um sucesso também pela rapidez com que informações recentes sobre personalidades sejam agregadas aos verbetes?
Discuto uma possível “wikificação do jornalismo” em um artigo recém publicado em português no livro Metamorfoses Jornalísticas 2 e na revista BJR. Lá faço uma distinção que, aparentemente, é bem parecida com a que o Doria propõe: wikis só de jornalistas (ou pessoas previamente autorizadas) e wikis abertos, como a Wikipédia.

Acho que como os wikis têm um potencial tremendo como ferramenta para edição de conteúdo jornalístico, principalmente numa época em que a rapidez de produção tem se confundido com uma fragmentação excessiva do conteúdo publicado. A cobertura de eventos duradouros e temas mais complexos pode perfeitamente ser editada em um wiki, que serveria ainda como plataforma para armazenamento a longo prazo. A abertura ao público pode (e deve) acontecer de acordo com o grau de visibilidade do veículo e do assunto.

As frequentes situações de vandalismos em artigos de maior destaque na Wikipédia, inclusive daqueles vinculados a personalidades ou eventos recentes, mostram que a abertura total é inviável – tanto que na Wikipédia os editores tomam frequentemente medidas mais duras, com a proteção do artigo.

Eu não acho a Wikipedia democrática, ela é regida por uma liturgia que em muito lembra o poder fisicamente constituido. Se você pudesse mudá-la, onde mexeria?
Sim, lembra o “poder fisicamente constituído”, principalmente porque advém dele. Acho que todos nós gostaríamos, mas é um contrasenso e inocente acreditar que um projeto on-line poderia facilmente superar questões fundamentais de nossa sociedade, como disputas de poder e intolerância.

O grande desafio da Wikipédia – e se eu pudesse, mexeria nisso, claro – é aumentar a coordenação do trabalho e não associá-lo ao uso abusivo do poder. Há um outro aspecto que me incomoda muito na Wikipédia: no geral, sua interface ainda é muito pouco amigável para o usuário leigo.

Refiro-me primeiramente à própria linguagem de marcação usada no software MediaWiki, que é um empecilho para uma edição mais estruturada por um novato. Esta questão culmina, por exemplo, na dificuldade para se entender os processos internos de votação, discussão, socialização etc. Se a Wikipédia mensurasse a participação dos editores através de um karma (visualmente, inclusive) mais objetivo, como fazem sites de ediçao colaborativa (Digg), seus processos nternos seriam mais transparentes.