Arquivo do mês: janeiro 2010

O Estadão e sua posição sobre o link externo, esse direito

Aleluia: demorou, mas alguém relevante no ecossistema de notícias tocou na ferida do link externo, esse direito, como bem definiu o professor Jeff Jarvis.

Em entrevista ao Jornalistas & Cia., Pedro Doria, editor-chefe do Estadão.com, foi claro ao falar sobre a missão do site Economia & Negócios, que nasce também com uma interessante integração embutida em papel (terá uma versão semanal na edição impressa de O Estado de S. Paulo).

“Quando elas [as notícias] estiverem em sites de outros veículos, principalmente estrangeiros, nosso leitor será informado do link. Queremos fidelizá-lo não só pela qualidade editorial e credibilidade de nossos veículos, mas também por tratar a informação _quer dizer, a boa informação_, esteja onde ela estiver, como um bem valioso para quem atua ou acompanha a área econômica”, disse Doria à newsletter que perscruta os bastidores jornalísticos brasileiros.

É claro que, se a opinião de Doria vale para um produto econômico, vale para qualquer outro. Mais do que presença no DNA da internet, o link externo é uma prestação de serviço importante na plataforma. É por meio dele que se encurtam distâncias e o usuário pode ir aos finalmentes.

Pedi ao Doria que detalhasse um pouco mais o assunto. E, de fato, a lógica por trás do raciocínio é tão simples que basta um parágrafo para resumi-la.

“Não há leitores exclusivos na web – todos leem o que lhes interessa em todos os sites. Editar a informação é obrigação jornalística. É ajudar o leitor em sua busca por informação. Facilitar sua vida. Se vamos criar um site de Economia, devemos ajudá-lo também indicando o que ler sobre economia em outros cantos da internet”.

De novo: isso vale para todas as editorias. Já passou da hora de a grande mídia derrubar de vez o tabu do link externo. Há um belíssimo exemplo e, antes que digam bobagem, iniciativas semelhantes (mas esporádicas) aqui e ali. E sem a defesa terminante, diga-se.

A defesa do link externo é muito mais do que disputa por audiência: estamos a falar da estrutura que deu essa cara democrática à web e, ao mesmo tempo, de uma obrigação para quem ainda desempenha (ou acha que desempenha) o papel de gatekeeper.

O resgate do avião que pousou no rio Hudson

Lembra do avião da US Airways que há um ano fez um pouso forçado no rio Hudson, em Nova York? Pois é, surgiu um vídeo bacana, no modo ultravelocidade, que mostra todos os detalhes da trabalhosa operação para retirar a aeronave da água _foi trabalho para três dias, balsas e guindastes imensos, muita gente envolvida na operação.

O formato em si não é novo (o cinema e a televisão já tinham recorrido há décadas ao fastforward para mostrar, em bem menos tempos, evoluções como o brotar de uma flor), mas anda meio esquecido no jornalismo.

Poderia ser usado, por exemplo, com um câmera que monitorasse um local sabidamente vulnerável a enchentes, e editado de modo a mostrar as águas chegando, tomando conta e, depois, partindo.

Um comentário: acho que é o típico formato que exige data e hora em algum canto da tela para posicionar muito bem o usuário sobre a cronologia do incidente.

Bem bacana e, de novo, simples e antigo.

Quando uma foto mostra mais que mil vídeos

Agora sim surgiu uma reflexão bacana sobre a diferença entre vídeo e audioslides (produtos que priorizam fotos, de preferência acompanhadas de som ambiente): a diferença que um fotograma pode fazer.

O exemplo de Daniel Sato é excelente: um momento único do boxeador Muhammad Ali congelado em instantâneo, e o vídeo da mesma cena, que deixa o gesto quase imperceptível.

O Garapa, coletivo de fotógrafos preocupados em como continuar a passar a mensagem aproveitando o avanço tencológico, ofecere uma mistura de ambos, vídeos e slides animados. E o som ambiente, claro. Esse é indispensável.

É importante que, nessa era do vídeo (e viva a banda larga!), a foto não seja esquecida. Ela oferece excelentes oportunidades de conteúdo multimídia.

Pressionado por policiais, blogueiro deleta posts

O autor de um blog na Inglaterra foi constrangido por dois policiais e acabou por deletar de sua página posts que acusavam o padre da cidade de antissemitismo. Rory Cellan-Jones conta a história na BBC.

Joseph Wiseman, autor do blog Seismic Shock, investia contra o vigário Stephen Sizer _segundo ele, o anglicano fazia sermões culpando Israel por crimes de guerra e sugeria até que empresas britânicas desfizessem parcerias com companhias israelenses.

Como parte dos textos eram postados dentro da Universidade de Leeds, onde Wiseman estuda, ele acabou rastreado. Foi investigado na instituição e, dias depois, recebeu a visita de uma dupla de policiais, quando resolveu apagar os posts. Ele não foi processado.

Efeitos colaterais por termos uma imprensa própria na era da publicação pessoal. Hoje, todo mundo publica. E está sujeito a ações (legais e ilegais, caso da inglesa) do tipo.

Quando o furo é de um jornal pequeno não vale?

Tem uma situação bacana rolando nos Estados Unidos. O National Inquirer, um tabloide considerado (pela elite) de quinta categoria, deu o furo de 2009 mas foi excluído da seleção do prêmio Pulitzer (o mais importante do jornalismo) por uma questão técnica: a matéria foi publicada dois anos antes.

Publicação nunca levada a sério (pudera, tem um cabedal de capivaras por apuração malfeita), o Inquirer revelou, em 2007, que o babe face John Edwards, vice de John Kerry nas eleições presidenciais de 2004 e pré-candidato democrata quatro anos depois, teve um filho fora do casamento.

Só agora a história veio à tona _Edwards teve de fazer uma retratação pública depois que o assessor que escalou para se passar pelo pai da criança (inclusive vivendo sob o mesmo teto com a “família”) escreveu um livro revelando a farsa.

O “jornaleco” tinha razão, e deu A matéria de 2009. Seu pecado foi ter feito isso dois anos antes _condição que deveria garantir imediatamente o prêmio.

Agora há um debate se o tabloide merecia o Pulitzer, e os que repudiam a ideia lembram muito a controvérsia do Prêmio Esso de 2004, concedido a Renan Antunes de Oliveira e seu perfil de Felipe Klein, filho de ministro alcoólatra, que embarcou na onda da body modification e terminou estatelado numa lixeira de prédio ao cair do nono andar.

A reportagem foi publicada no jornal Já, de Porto Alegre. E a comenda (o nosso Pulitzer) desencadeou uma reação desproporcional do mainstream, que tentou desconstruir a reportagem.

Entendo perfeitamente o jogo (e labuta) por trás de reputação e credibilidade de um veículo jornalístico. Mas a plataforma não pode ser, jamais, o critério para se julgar uma boa matéria.

Cobrar por conteúdo pode fazer vender mais jornal?

O NYTPicker, blog crítico à cobertura e aos procedimentos do The New York Times (que eu recomendo, é insider total), formulou uma tese interessante sobre a decisão do jornal de cobrar por conteúdo on-line a partir de 2011.

A medida exclui, você sabe, os assinantes da edição impressa (inclusive os de final de semana), que terão acesso full à versão na web.

Na versão do Picker, aparentemente o NYT pretende ampliar a carteira de assinantes da edição impressa. O site pergunta: “Por que não assinar e receber o jornal em casa, ganhando de bônus o acesso ilimitado ao on-line?”

Tem um buraco nessa estratégia _se é que se trata de uma estratégia. Os atalhos, também citados pelo Picker, para suavizar o paredão que o jornal norte-americano está construindo. O acesso é livre quando o link provém de mecanismos de busca e sites de redes sociais.

O Picker conclui dizendo que a cobrança por conteúdo on-line não passa de tentativa de vender mais papel. E faz uma constatação: apesar de toda a excelência de seu conteúdo on-line, o jornal ainda conta com o poder da versão impressa para sua subsistência.

Isolados do mundo, repórteres testam poder da mídia social

Um experimento interessante vai acontecer numa fazenda na região de Périgord (França). Ali, repórteres de rádios de Bélgica, Canadá, França e Suíça ficarão isolados do mundo, sem telefone celular, televisão ou jornais. Diante deles, um computador que acessará unicamente Facebook e Twitter.

A ideia é testar quão valiosos são os dois sites de redes sociais na divulgação imediata de notícias (o bom e velho breaking news). No final das contas, os responsáveis pela experiência querem provar que a mídia social desempenha um papel fundamental na maneira como as notícias são distribuídas hoje.

NYT conversa com os leitores sobre cobrar por conteúdo on-line

O New York Times está conversando com seus leitores sobre a decisão de cobrar por acesso ao conteúdo de sua edição on-line a partir de 2011.

Duas decisões sábias. A primeira, o diálogo, obrigatório _sempre. A outra foi dar prazo de um ano para que a drástica decisão (não recomendável a um jornal generalista) seja debatida e, isso espera o jornal, digerida.

O movimento do NYT foi ao mesmo tempo ousado e cauteloso. A guerra pela volta do muro do paredão pago, capitaneada por Rupert Murdoch, está mal começando. O próprio Murdoch adiou, em seus veículos, a entrada em vigor do pedágio.

Design na web é como moda: tem lá suas tendências

Fontes serifadas (Arial e Verdana até hoje dominam a web), topos espaçosos e estilosos, uso de fontes personalizadas (graças a ferramentas como The League of Moveable Type) e minimalismo aparecem entre as tendências de webdesign para os próximos anos.

A “diagramação da internet”, como eu costumo chamar,  segue muito o conceito da moda: as coisas surgem por temporada, depois vai um copiando o outro (aprimorando, em muitos casos) e pronto, está lançada uma nova bossa (aliás, é assim que funciona no papel também).

Mas essa coleção apresentada pelo Webdesigner Wall, altamente ilustrada e com links para todos os exemplos, serve como referência de coisas boas que estão na rede e nem ficamos sabendo. Material para consultar e experimentar.

Quem viu essa história primeiro foi o ótimo Contra a Clicagem Burra.

É mais fácil fazer jornalismo em zonas remotas, de conflito, catástrofe e privação?

É mais fácil fazer jornalismo em zonas remotas e/ou de conflito, catástrofe e privação?

O trabalho do videojornalista holandês Ruud Elmendorp sugere que sim, assim como o de centenas de frilas e enviados especiais ao Haiti após o terremoto. É o ouro na mão: para onde você focaliza, há uma boa história a contar.

Elmendorp está na África abordando vários aspectos da vida no continente. E com uma visão de vídeo na web que eu defendo há tempos: nada de parecer TV. Ele apura, escreve roteiros, e cobre tudo com imagens e som ambiente (incluindo entrevistas informais). Não aparece fazendo passagens, essa instituição tipicamente televisiva da qual a rede precisa se libertar _ela é válida quando fazemos TV na web, não quando fazemos vídeos para a internet.

O holandês talvez esqueça o conceito ao ditar offs empolados, no estilo documentário _eu acho que nem off deveria haver, ou seja, que o bom vídeo na internet precisa prioritariamente de corte rápido, som ambiente e imagens incidentais. Imagens mais som ambiente têm de ser capazes de contar uma história. No caso de um produto associado a um jornal, por exemplo, é imperativo: é óbvio que há um texto complementar ao vídeo, o que dispensa a redundância. Não é o caso de Elmendorp, mas registre-se.

Enquanto isso, vi um vídeo em Veja que explora outro aspecto: o da “importância” de mostrar que realmente temos um enviado especial. A presença do repórter é totalmente dispensável nas imagens, rouba atenção dos enquadramentos mais importantes e _grave_ não acrescenta nada ao que certamente seu registro textual trará no final de semana.

Especificamente sobre o enviado de Veja (e minha observação acima é genérica, foi repetida por outros), no microblog sua presença é louvável, solícita e aberta à conversação. Uma aula de como fazer.

Mas que é mais fácil conseguir boas histórias em zonas remotas, de conflito, catástrofe natural e privação, isso é. Batata.