Arquivo do mês: julho 2008

Contra a clicagem burra

Como bem sabemos, edição, além de um processo de escolha e hierarquização do noticiário, também pressupõe limpar redundâncias entre todas as peças que compõem o jogo gráfico (seja em papel ou on-line).

No quesito eletrônico, o blog “Contra a Clicagem Burra“, capitaneado pela colega Luciana Moherdaui, tem cumprido um excelente papel apontando as repetições nossas de cada dia em páginas espalhadas pela web.

Redundâncias como o famigerado “clique aqui”, que faz o hiperlink imediatamente se tornar um elemento decorativo _cabe, à edição, escolher palavra (ou palavras) que, transformadas em hiperlink, transmitam ao receptor exatamente a sensação de onde ele vai desembocar.

O blog da Luciana vale um belo passeio e uma análise bastante profunda.

Não caiu a ficha ainda?

É incrível que ainda hoje, meses depois da explosão e já consolidado, o microblog ainda suscite discussões sobre suas funcionalidades jornalísticas.

É o que leio, pelo menos, neste texto de John Dickerson. “Para muitos jornalistas e guardiões da profissão, a idéia de que algum jornalista possa voluntariamente adotar um espaço mais curto é horripilante e burra”, diz o jornalista político, sobre os indefectíveis 140 caracteres da plataforma.

Dickerson avança na conversa e conclui, claro, que a ferramenta é utilíssima para quem trabalha com informações. Afinal, o que nós, jornalistas, estamos fazendo agora? Apurando notícias.

“Enquanto passo quase todo o meu tempo na estrada, atualmente, cobrindo as campanhas presidenciais, o Twitter é o lugar perfeito para todas aquelas observações que escrevi nas centenas de bloquinhos que tenho guardados na minha garagem de coberturas de campanhas e outras reportagens ao longo dos anos. Dentro desses blocos estão pequenos pedaços de vida que captei ao longo do caminho. Às vezes, eles fogem demais do assunto ou são inconseqüentes demais para colocar numa reportagem. Às vezes, são pequenas noções ou pensamentos paralelos que se tornam o lead de uma reportagem. Todos eles encontraram seu lar no Twitter”.

Tudo bem, mas então o microblog só se presta a abrigar restos? Por que o lide de uma reportagem (ou seu primeiro período) não podem ser divulgados via essa ferramenta? E notícias de última hora, essas sim talhadas para freqüentar o limitado (em caracteres) espaço do microblog?

Outra preocupação minha agora, diante de tantas ferramentas de microblog existentes, é que estamos vivenciando um novo fenômeno Bombril. O próprio jornalistão cita Twitter como um sinônimo de microblog, não como um produto.

Nesse aspecto, a vida on-line ainda está muito chata. Não estamos amarrados a produtos, mas a idéias.

Preto no branco, jamais o inverso

Finalmente hoje o utilíssimo La Buena Prensa traz um exemplo do que não deve ser feito por um jornal impresso. É a página aí de cima, ou deste hiperlink aqui, do Diário de Burgos (Espanha).

Tome note: jamais, num jornal, use fundo escuro com letras brancas. Você pode estar simplesmente dizendo a seu leitor “não leia esse texto”.

Explico: não só o papel jornal tem qualidade ruim como, via de regra, a impressão no Brasil a torna ainda pior. Por isso, erros de registro são comuns. No caso de letras brancas, a leitura fica absolutamente impossível.

A recomendação não vale para revistas e produtos que utilizam papel com gramatura maior _portanto, com chance de mais qualidade na impressão.

A página do Diário de Burgos fica bonita aqui porque o que estamos vendo é um PDF. Pega o jornal na banca para você ver que bicho que pode sair…

Quem faz jornalismo como o jornal?

No livro “O Destino do Jornal”, de Lourival Sant’Anna (repórter especial de O Estado de S.Paulo), Rodolfo Fernandes, diretor de Redação de O Globo, desenvolve um conceito bastante interessante num momento em que estamos precisamente discutindo a vida útil dos jornais impressos.

Para Fernandes, nenhum outro meio faz o tipo de jornalismo que o jornal em papel consegue fazer. Não há, segundo ele, concorrência com o veículo _sobre o qual pairam previsões sombrias de esgotamento da fórmula e encerramento de atividades.

“Não vejo ninguém fazendo”, diz ele. É uma observação que merece reflexão. Por que, afinal de contas, se o jornal conseguir se mobilizar num nicho onde não há ninguém, teoricamente sua sobrevivência estará garantida.

Pegue especificamente as últimas edições dominicais dos jornalões brasileiros (por jornalões leia-se O Globo, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo). Que resultado teria, na Internet, o levantamento em 168 cidades brasileiras feito pelo Datafolha e que virou manchete do jornal, um mapeamento sobre o jovem brasileiro?

Outro aspecto detectado por Fernandes é definitivo. “O jornal não é mais um meio de comunicação de massa. Ponto”. É fato que a substancial queda na circulação nos últimos anos provaria cabalmente. Desde o ano passado, porém, houve uma lenta e gradual recuperação, no Brasil e no mundo.

Ponto favorável aos jornais de papel é a inegável capacidade, ainda intocada, de pautar seus concorrentes de outras mídias, especialmente a TV e o rádio _a Internet, como eu já disse certa vez, “acorda jornal”, ou seja, começa o dia reproduzindo reportagens de jornais do mundo inteiro.

Agora, qualquer um que se debruça sobre o tema concorda que, se não abrirem mão de relatar prioriamente o hard news, o “aconteceu ontem”, os jornais tendem a perder ainda mais sua relevância. A análise, a contextualização e, principalmente, a compreensão histórica de qualquer notícia é o caminho para um novo cardápio que desafie o ataque de véspera proporcionado por TV e Internet.

É o dilema entre a modernidade e o registro histórico do dia que passou, função que o jornal impresso desempenhou com habilidade por séculos.

Aí a discussão vai se concentrando no formato que, como dizem alguns, é “chato” (conceito vago e impreciso). Curioso, mas todas as pesquisas qualitativas realizadas com leitores de jornal reafirmam a “portabilidade” do produto.

Alguma vantagem há de existir em algo que não precisa ser colocado na tomada. Voltaremos ao tema.

Um índice de 1 trilhão de páginas

O Google anunciou que atingiu a incrível marca de 1 trilhão de páginas indexadas nesta sexta-feira. Em seus primórdios, nos idos de 1998, eram 26 milhões. Dois anos depois, já eram 1 bilhão.

O Readwriteweb lembra, com bastante propriedade, que quantidade não é sinônimo de qualidade.

Fréderic Lardinois cita que a promessa da tão sonhada busca semântica (na qual o mecanismo “adivinha” o que você está procurando e refina seus resultados) continua sendo apenas isso: uma promessa.

Os resultados de uma pesquisa no Google ainda são poluídos e vêm carregados de links impróprios. Como não há competição no setor, estamos nas mãos dele, o Google.

“Qantas never crashed”

Lembram que Raymond, mais conhecido como Rain Man (personagem interpretado por Dustin Hoffman no cinema) repetia à exaustão “Qantas never crashed”, referindo-se à companhia aérea australiana que nunca _na era dos jatos, bem-entendido_ perdeu um avião num acidente?

Pois quase foi hoje.

Como não foi, um vídeo gravado dentro da aeronave (obrigada a fazer um pouso de emergência por causa de um buraco na fuselagem) já está disponível em sites de compartilhamento de vídeos.

Ponto para o Jornalismo Cidadão? Francisco Madureira, o Madu, diz que não, que é só puxar pela memória e se lembrar do notório “imagens gravadas por cinegrafista amador” que ouvíamos, bem às vezes, no Jornal Nacional.

Essa imagem, porém, só chegava à emissora porque o tal amador, empolgado com a possibilidade de ganhar uns trocados, ia atrás de um número de telefone, enchia o saco de alguém e vendia seu peixe.

Hoje não. Sem motivação financeira, o vídeo (que vale mais do que qualquer notícia sobre o fato) já está lá, ao alcance de qualquer um, esclarecedor.

Talvez o jornalismo cidadão tenha esse aspecto diferenciado: enquanto o cinegrafista amador “trabalhava” para um único veículo (aquele que comprava a imagem), os amadores da era da Internet e suas facilidades de publicação expõem seu trabalho livremente e concorrem com os meios tradicionais pela atração da audiência.

Ou não?

Alguém já viu uma jaca despencar 5%?

Editor-executivo do jornal Valor Econômico, Pedro Cafardo ressuscita hoje aqui, sem saber, nossa série sem planejamento nem periodicidade sobre clichês que assombram o jornalismo _desta vez, como não poderia deixar de ser, com ênfase na editoria de Economia.

Como sempre quando analisamos as bobagens que escrevemos por anos a fio sem nos darmos conta, o texto é praticamente obrigatório não só para quem é do ramo, mas para quem tem o português como ferramenta de trabalho.

Ainda nascem bebês-diabo

Oficialmente, é um jornal, com editor, repórteres, colunistas _e, pasmem, leitores. Na verdade, não passa de uma anomalia. É o que me permite supor a história do “homem-sereio” que estaria aterrorizando Manaus.

Estou falando do tablóide popular “Maskate“, publicado em Manaus. O veículo sensacionalista, infelizmente, é adepto do lado mais deprimente dessa vertente: a mentira.

Histórias forjadas fazem parte da própria história do jornalismo. Ponto. Agora, hoje isso ainda cola? Ou é diversão pura (de quem faz, não de quem lê)? Num momento em que o papel é cada vez mais raro, ter um jornal para fabricar notícias parece surreal.

Ok, você vai me dizer que, na Inglaterra, os jornais que mais vendem são sensacionalistas. Pura verdade, mas com um porém: seu sucesso é baseado no flagra, na imagem de famosos cometendo pequenos, grandes ou nenhum deslize. É a força da imagem. Elas estão lá.

Como está, no Maskate, a “foto” do homem-sereio e uma fantasiosa versão para suas aparições.

Impossível não lembrar do “Notícias Populares” e sua incrível seqüência de “notícias” inventadas. A mais célebre, o bebê-diabo, que passeou pela primeira página do extinto rotativo por quase um mês seguido. Trinta dias de enganação e de pantomima.

Isso é jornalismo?

Merchandising no meio do noticiário?


Reparou nos dois copos de café (com o logo do McDonald´s) que aparecem à frente dos apresentadores de um telejornal matutino da rede norte-americana Fox 5? Pois é. Depois dizem que o jornalismo acabou e você não acredita.

Como é tolerável que um produto jornalístico faça merchandising tão descaradamente? Digo descaradamente porque, fosse por debaixo dos panos, ainda teríamos de descobrir. Do jeito que está posto, nem isso.

A Fox, por sinal, é recorrente nesse tipo de avançada de sinal que afronta a credibilidade da profissão: seus profissionais utilizam equipamentos da Apple (deixando sempre visível, claro, a marca do fabricante).

Se você não entendeu ainda, eu, que sou paciente, explico: notícias negativas envolvendo Apple ou McDonald´s terão que tipo de abordagem nesta emissora?

Quando o merchandising invade o espaço jornalístico, é melhor mudar de canal.

A dica é do Poynter, mas o António Granado também distribuiu.

Polícia caça policiais blogueiros nos EUA

A história é muito boa: irritado com o blog “MPD Enforcer“, o chefe de polícia de Memphis (EUA), Larry Godwin, enviou notificações ao provedor que hospeda a página e até ao Google para tentar obter informações sobre seus proprietários.

É evidente que medida, além de tomada à margem da lei (Godwin só pôde fazer isso por ser a máxima autoridade policial da cidade, já que ele não possui uma autorização judicial), ainda afronta a primeira emenda da Constituição do país.

A discussão no “MPD Enforcer”, tocado por policiais e que critica com veemência a força pública local com ironias como a eleição do idiota do mês (todos oficiais graduados), está pegando fogo.

O mais bacana: o produto existe desde 1995 (anterior à Internet, portanto), e só chegou à rede em 1998. Dez anos depois, o anonimato dos policiais foi mantido incólume.