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Ação de marketing ressuscita o Notícias Populares

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Pra quem não viu: uma ação de marketing do lançamento do filme Faroeste Cabloco ressuscitou, ainda que por um dia, o Notícias Populares, o jornal que falava com o povão mas era editado pela elite – vários dos jornalistas de maior protagonismo na publicação eram oriundos da USP, mais especificamente da ECA, a Escola de Comunicações e Artes da principal instituição de ensino superior do país.

O NP (aquele que vertia sangue se fosse amassado) circulou em São Paulo entre 1963 e 2001, quando o Grupo Folha decidiu descontinuar o título.

Até hoje, porém, é cultuado por toda uma geração de jornalistas que teve ali seu primeiro contato com a profissão – vários atualmente têm postos importantes em grandes corporações.

Jamais incensei ou coloquei o NP num pedestal simplesmente por não conceber graduações de sensacionalismo.

Não é porque garotões bem nascidos e criados fizeram do jornal seu parque de diversões de experimentalismos no esgoto da imprensa que, de alguma forma, a publicação mereça um salvo-conduto.

Por sinal, a cobertura do caso da Escola Base, um momento que proporcionou diversão épica para a garotada que brincava de fazer jornalismo e que gostava de se masturbar mentalmente com as manchetes que criava muitas vezes escoradas em gírias cantadas pelos contínuos , foi um passo decisivo para fechar o caixão do jornal. Que descanse em paz.

Uma visita ao jornal mais vendido do Brasil

Nesta semana tive o prazer de conhecer a redação do jornal mais vendido do Brasil (303.269 exemplares, em média, em março): o Super Notícia, de Belo Horizonte, para quem muito jornalista torce o nariz por puro preconceito.

Claro, o Super é um fiel representante do jornalismo que pejorativamente chamamos de popular (mas cuja procura e tiragem justificam plenamente a alcunha, não?). É um Notícias Populares de nosso tempo que nem de longe recebe a veneração de seu parente paulistano distante _e já extinto.

Com o tripé crime-futebol-mulher (e boas pitadas de serviço), o diário (que no sábado festejou 8 anos de vida colocando na capa um garoto da mesma idade nascido em 1º de maio de 2002, quase que simultaneamente ao jornal) é um exemplo da importância da edição e da sabedoria em reempacotar conteúdo.

A equipe é enxutíssima: são nove pessoas na linha de frente, sendo um editor, cinco fechadores e três repórteres funcionando num pedacinho da redação que também abriga outros jornais do grupo, como o generalista O Tempo e o semanário Jornal Pampulha.

Reaproveitar conteúdo dos outros veículos da casa é uma das chaves do sucesso da publicação, que tem uma empatia extraordinária com seu público (não são raros os casos de leitores que ligam primeiro para a redação, e só depois para a polícia).

Outro detalhe que ajuda a explicar o sucesso (além do preço, R$ 0,25, que surfa na onda de prosperidade das classes C, D e E, essas recentemente convertidas em leitores de jornal) é a estratégia de distribuição: o Super está onde você puder imaginar (supermercados, drogarias, padarias e bancas, claro).

Também há os famosos “anabolizantes”, que vão de coleções de miniaturas a camisas de futebol.

O fato é que o jornal é um fenômeno que a própria academia vem tentando entender (são diversas as teses de mestrado dissecando sua fórmula).

Um viva ao editor Rogério Maurício, com quem conversei rapidamente. E longa vida ao Super Notícia.

Agradeço ainda às acolhidas calorosas de Luiz Tito, vice-presidente do grupo Sada (que edita os jornais mineiros citados), Lúcia Castro, editora executiva, e Michele Borges, secretária de redação.

Só o deadline está sempre na mesma

Comecei no jornalismo diário em 1990, na Folha da Tarde, jornal que mais tarde, numa quase fusão com o Notícias Populares, gerou o Agora (o NP, na verdade, fechou dois anos depois da mudança de nome da FT, mas isso proporcionou uma absorção de parte de seu cardápio pelo único jornal popular que seria publicado dali por diante pelo Grupo Folha).

Era uma época bem diferente.

Pra começar, na entrada da redação tinha um pote forrado de fichas telefônicas _claro, não havia celular, e contato entre base e repórter só era possível se este último fosse a um orelhão dar sinal de vida.

Muitas vezes, esta ligação servia como modo de transmissão da matéria. Explico: muitas das coisas que fazíamos na rua tinham de ser simplesmente ditadas, porque não havia outro modo de passar a informação à redação.

Ficávamos mais tempo na rua, disparado. A verdade é que a rua era o refúgio do repórter. Hoje, monitorado o tempo inteiro, virou um calvário documentado em tempo real.

O contato externo com o jornal era exíguo. Ou envolvia um mensageiro portador de rolos de filmes, documentos e manuscritos _seja motorista, amigo fazendo um favor, o que seja_, ou era todo feito por telefone. Jornais mais diligentes usavam radiotransmissores, conhecidos como walkie-talkie (o fax, diga-se, apareceria pouco depois).

O dia a dia de produção do jornal envolvia ainda tarefas demoradas, como o past-up (a montagem manual, com cola Pritt e estilete, de cada página da edição), a transformação daquilo em chapa, a preparação da rotativa, bem menos expedita do que nos tempos de hoje, e a própria rodagem da edição _nem é preciso dizer que o equipamento atualmente disponível para as editoras imprime até dez vezes mais rápido a mesma quantidade de papel.

Você já deve estar aí rindo de tanta dificuldade, pensando em como era fazer jornalismo na era da pedra lascada (e olha que nem citei a inexistência da internet _ou do Google, como queira).

Mas tem uma coisa que não mudou em nada de lá para cá: o horário do fechamento.

É sério, alguém, me explica: por que, com tanto avanço tecnológico notório e a olhos vistos, o deadline, o maldito deadline, é praticamente o mesmo em 2009 como era em 1990?

Não é balela, eu vi: em alguns casos, como o das edições de domingo, o limite para concluir a edição era mais extenso há 19 anos do que atualmente. É, na minha eleição, o maior mistério que permeia o jornalismo impresso.

Se todos os gargalos se abriram, porque só o horário do fechamento não reagiu?

Ainda nascem bebês-diabo

Oficialmente, é um jornal, com editor, repórteres, colunistas _e, pasmem, leitores. Na verdade, não passa de uma anomalia. É o que me permite supor a história do “homem-sereio” que estaria aterrorizando Manaus.

Estou falando do tablóide popular “Maskate“, publicado em Manaus. O veículo sensacionalista, infelizmente, é adepto do lado mais deprimente dessa vertente: a mentira.

Histórias forjadas fazem parte da própria história do jornalismo. Ponto. Agora, hoje isso ainda cola? Ou é diversão pura (de quem faz, não de quem lê)? Num momento em que o papel é cada vez mais raro, ter um jornal para fabricar notícias parece surreal.

Ok, você vai me dizer que, na Inglaterra, os jornais que mais vendem são sensacionalistas. Pura verdade, mas com um porém: seu sucesso é baseado no flagra, na imagem de famosos cometendo pequenos, grandes ou nenhum deslize. É a força da imagem. Elas estão lá.

Como está, no Maskate, a “foto” do homem-sereio e uma fantasiosa versão para suas aparições.

Impossível não lembrar do “Notícias Populares” e sua incrível seqüência de “notícias” inventadas. A mais célebre, o bebê-diabo, que passeou pela primeira página do extinto rotativo por quase um mês seguido. Trinta dias de enganação e de pantomima.

Isso é jornalismo?