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Fake news e jornalismo colaborativo

De repente, o mundo descobriu que estamos todos em perigo de extinção por causa da disseminação de notícias falsas – apenas mais um dos efeitos colaterais do avanço tecnológico e da possibilidade de qualquer pessoa ser um publicador. Nossos filhos correm sério risco de vida e a própria democracia, como a conhecemos, será destruída.

Quer dizer então que nunca houve distribuição de informações inverídicas até o advento das redes sociais?

Faz-me rir. Isso aconteceu desde sempre, dos rabiscos nas cavernas à oralidade, chegando à imprensa propriamente dita (ofício aliás criado para defender interesses muitas vezes com base em argumentos tortuosos e pouco afeitos à verdade).

Seres humanos mentem o tempo todo, distorcendo a realidade de acordo com seuus interesses. No caso específico das fake news de nosso tempo, o chequinho em dólares por clique pago pelo Google basta – mas é óbvio que a manipulação pode atender a propósitos bem menos paroquiais e patrimonialistas. Como ocorreu desde sempre.

A notabilização desse furo no modelo ‘as notícias são para todos’, que provocou furor entre acadêmicos (entre eles, esse que vos fala) e popularizou o conceito de jornalismo colaborativo que Dan Gillmor e Jay Rosen tão bem descreveram há mais de dez anos, não significa que o jornalismo das pessoas está em xeque.

As noticias falsas surgiram muito antes, no âmbito do dito jornalismo profissional. Não é preciso percorrer muitos quilômetros, aliás, para encontrar expoentes dessa vertente em qualquer canto. O tal jornalismo profissional é bonito, mas infelizmente é para poucos.

A utopia do jornalismo colaborativo não se encerra com a epidemia de falsidades distribuídas via novas plataformas. Os seres humanos continuam tendo o direito de relatar/analisar/comentar/distribuir fatos, sejam jornalistas de ofício ou não. A questão é que estes, e já faz tempo, podem ter muito mais alcance do que os players do mercado – justamente os mesmos que, em seu momento, compartilharam suas próprias inverdades.

Aí mora uma outra questão interessante deste debate. Voltarei a ela.

Morrendo de medo das pessoas

folha_newsQuando um veículo da envergadura da Folha de S.Paulo, o maior jornal brasileiro, sai novamente a público com a intenção de demonstrar que no jornalismo o furo “é resultado de técnica e trabalho profissional“, é porque definitivamente a mídia formal continua encarando a mídia das pessoas como um concorrente, não como integrante do ecossistema de notícias.

Chega a ser patético ter de lembrar ao consumidor, periodicamente (a mais recente havia sido o protagonismo do jornalismo tradicional no compartilhamento de notícias durante os protestos de junho), que a mídia está fazendo o seu trabalho.

Na era da conversação, isso não é mais o suficiente. Há, além das notícias em primeira mão produzidas pelo público, uma demanda crescente por parcerias amador-profissional, entes que se complementam, jamais se digladiam. Isso sim é fazer jornalismo do futuro.

Um raro protesto de jornalistas na redação

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A demissão de toda a editoria de fotografia do Chicago Sun-Times, na semana passada, provocou uma cena rara no meio jornalístico: um piquete na frente da redação, ontem.

A intenção dos 27 demitidos – e de vários de seus ex-colegas de redação que participaram da manifestação – é fazer com que o jornal volte à mesa de negociação para discutir uma medida menos drástica do que a extinção da editoria.

A partir de agora, frilas e repórteres (que estão recebendo treinamento para saber usar o iPhone além das relações pessoais) serão os responsáveis pelas imagens do jornal.

Nem é preciso lembrar aqui o caminho de anos e anos, percorrido por mim, falando sobre as novas exigências do jornalismo (a multitarefa entre elas) e, mais, sobre a importância dos dispositivos móveis para o registro de fatos.

Sempre critiquei a indisposição (de empresas e de jornalistas) com relação à mídia das pessoas, normalmente lembradas apenas num momento de tragédia não registrada por profissionais – aí sim, seu papel se transforma em coisa valiosa. Não pode ser só na desgraça.

Também dediquei linhas e mais linhas a repórteres que alegavam inaptidão para a fotografia mas que, ao mesmo tempo, exibiam páginas pessoais forradas de todo tipo de registro desimportante de seu cotidiano.

Interessante mencionar, agora, a experiência do Diário do Guarulhos, onde fotógrafos (afinal, repórteres) receberam treinamento para escrever matérias, e vice-versa. Voltarei com mais dedicação ao assunto.

Finalmente: o trabalho jornalístico não pertence a uma casta de abençoados. Nessa controversa decisão do Sun-Times, minha única discordância imediata é com relação ao cartaz da foto acima, exibido no protesto. O passo que a provocou, aparentemente, tem tudo para ser um tiro no pé – mas carece de tempo para que se possa cravar tal condenação.

Notícias da Coreia

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Kim Jong Un ainda não apertou o botão (da bomba atômica), mas seus jornalistas publicam loucamente na KCNA, a agência de notícias oficial norte-coreana.

Óbvio que não fica nessa tristeza: o avanço da tecnologia deu aos cidadãos – até aos pobres norte-coreanos – meios de fugir dessa coisa funesta.

Dicas para verificar a autenticidade de conteúdo publicado em mídia social

O Poynter (o centro de estudos de jornalismo que tem um jornal) fez uma compilação, a cargo de Craig Silverman, sobre verificação de conteúdo em redes sociais – principal matéria-prima do jornalismo cidadão.

São ao todo oito links com procedimentos de grandes empresas de comunicação (como BBC e CNN) e ouras dicas valiosas. Divirta-se.

Jornalista cidadão é ameaçado de prisão nos EUA

A polícia de Baltimore ameaçou prender um jornalista cidadão que registrava uma ação de seus oficiais – ironicamente, dias depois de a própria instituição ter divulgado nota em que dizia preservar o trabalho de quem registra fatos por conta própria.

A  National Press Photographers Association (NPPA) protestou formalmente contra a ameaça.

CNN bomba sua “rede social de notícias”

No quinto aniversário do iReport, seu canal de jornalismo colaborativo, a CNN anunciou mudanças no que chama de “a única rede social de notícias” da web.

Agora, os repórteres-cidadãos têm homes personalizadas que além de catalogar o material que produzem, facilitam o contato.

O iReport é, de fato, a experiência mais bem-sucedida de convívio pro-am que se tem notícia na internet,

O jornalismo cidadão não morreu

A academia trocou o estudo do jornalismo cidadão pelo de mídias sociais (onde as pessoas também fazem jornalismo cidadão), mas isso não significa que a participação do público no processo de apuração, análise e difusão de notícias tenha entrado em declínio.

Trabalho recente do Open Society Media Program, a cargo da pesquisadora Nadine Jurrat, reforça o papel de democratização que  meio digital e avanço tecnológico  vêm jogando atualmente.

Mapping Digital Media: Citizen Journalism and the Internet.

Correspondentes comunitários fazem a diferença

Vale a pena prestar atenção no blog Mural, obra do jornalista Bruno Garcez, que fez um treinamento com 20 moradores da periferia de São Paulo, agora convertidos em “correspondentes comunitários”.

Uma ótima ideia e que efetivamente traz algo de novo para o jornalismo.

Já tinha falado sobre o Mural no ano passado, mas vale a relembrança porque, agora hospedada na Folha.com, a página tem trazido material consistente e bastante interessante.

Lições de quem entende o jornalismo como um diálogo

Arianna Huffington consegue reunir algumas das coisas que eu considero mais importantes quando tratamos de internet e jornalismo.

Em 2005, misturou blog e site para criar o seu Huffington Post, usando ainda o conceito de blogueiros convidados (e, mais importante, não jornalistas).

Ela foi ainda uma das entusiastas da participação do público no relato/análise de acontecimentos, tornando um case o projeto Off the Bus, que cobriu a eleição americana com cerca de 13 mil voluntários (e a supervisão de Jay Rosen, professor da Universidade de Nova York que conhece o assunto como poucos).

Em visita ao Brasil, Arianna falou com gente de internet e, na Folha, deu entrevista e se reuniu com a Redação.

Vale a pena ler tudo isso e refletir sobre esse momento da profissão. Afinal, 2011 está logo ali.