Leitores do New York Times têm sido surpreendidos, nos últimos dias, por correções de reportagens antigas publicadas pelo diário, o mais importante e influente do mundo. Algumas delas, bem antigas (vá ao item “The Arts”). Caso de um texto estampado em 1906 pelo diário.
A história completa quem conta é Craig Silverman, na Columbia Journalism Review. Um resuminho: em matéria publicada há 103 anos, o relojoeiro Jonathan Dillon contou ao jornal qual era o teor da inscrição que colocou na parte de dentro de um relógio depois ofertado ao presidente Abraham Lincoln. Só agora descobriu-se o conteúdo real da mensagem.
O caso é uma demonstração clara de mudança no exercício do jornalismo provocada pelo avanço tecnológico, minha principal linha de pesquisa acadêmica há dois anos. Claramente, a conexão 1906-2009 só foi possível por meio de mecanismos de busca na web.
Sou de um tempo em que pesquisar significava passar horas num lugar bolorento, empoeirado e sem ventilação. Por obra do especial da Copa de 1958 da Folha de S.Paulo, que coordenei no ano passado, revivi um pouco esses tempos com horas em arquivos de jornais de São Paulo, Rio e Montevidéu.
A reação que essas correções retrô provocaram é outro exemplo de interferência da tecnologia na prática da profissão: leitores que vasculharam referências a seus nomes no jornalão passaram a exigir retratação do periódico. Hoje, consta que são ao menos 12 pedidos por dia. Da simples correção de grafias à supressão total de notas sociais sobre casamentos que, tempos depois, acabaram.
Se o jornal impresso é um registro histórico do dia que passou, nada parece ser mais adequado do que esse revisionismo. No New York Times (e em quem mais se atreva a adotá-lo), porém, ele terá limites. Não há quadro para corrigir tudo o que o produto publicou de equivocado em sua história.
Além disso, seria uma impropriedade. É um documento histórico, não? Pois não comporta atualizações, muito menos a mais prosaicas, como a demanda do leitorado por atualizar o status de um casamento fracassado.
De toda forma, é mais um exemplo muitíssimo bem acabado de como a tecnologia transforma diariamente o fazer jornalístico.