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Reflexão na produção jornalística

Eu sou um homem de papel, mas há muito ligado ao on-line.

A diferença básica entre as plataformas é que, quando seu ciclo de notícias tem 24 horas, há tempo para juntar lé com cré, e hierarquizar melhor o conteúdo.

Em tempo real, é muito difícil fazer isso. Tarefa para alguns poucos gênios.

Daí me lembrei da TV e as lições que ela transmite. O entretenimento traz, embutido, muito do jornalismo que deveríamos fazer _em papel e on-line, depende aí o tempo que temos e o nível de nossa massa encefálica.

Como essa experiência de maio de 2006, quando o programa Fantástico, da Globo, preparou por seis meses o ator Osvaldo Mil para ser um falso vidente _que enganou muita gente na chamada “Operação Bola de Cristal”.

A série apresentada pela “revista eletrônica dominical” tem 40 minutos e foi, originalmente, exibida em quatro episódios de dez minutos cada.

Ali, o parapsicólogo Jayme Roitman e o mágico/ilusionista gaúcho Khronnus _com a narração de Cid Moreira_ expuseram as táticas que podem levar um picareta a convencer plateias (como de fato ocorreu) de seu inexistente poder paranormal.

Como as leituras fria (onde prevalece a observação do gestual e do vestuário) e quente (aqui vale vasculhar o lixo do cliente ou receber dicas que pessoas de seu entorno).

O programa mostra ainda como se constrói um pilantra: Angelo, o vidente criado por Mil, é treinado a ser verborrágico (maneira de dificultar a compreensão do que se diz) e adepto do espelhamento, outra estratégia de gurus que nada sabem sobre passado ou futuro _consiste em aproveitar brechas que as próprias pessoas dão ao fornecer, sem se dar conta, informações que depois serão usadas para iludi-las (a chamada falsa memória).

Tem muito mais coisa sensacional: técnica do arco-íris (quando se abarca tudo, quase em 360 graus, tornando a chance de erro mínima), o despacho do erro (“isso não é pra você”, suscitando a dúvida), a necessidade da cara fechada (vidente que ri muito não tem credibilidade).

Enfim, é uma aula de produção e jornalismo. Provar para as pessoas que elas podem ser facilmente enganadas é um baita serviço.

Quatro anos depois, enfim chegou a hora de citar esse excelente trabalho.

O polvo Paul e o ridículo no jornalismo


Não tem nem dois dias que eu ressuscitei uma entrevista do goleiro Rogério Ceni (na qual o cara falava sobre encarar esporte como entretenimento), e me deparo agora com um texto que avalia a corrida do jornalismo ao polvo “vidente” Paul como uma babaquice sem tamanho, uma jogada da marketing do aquário de Oberhausen, na Alemanha.

É nessas horas que o ditado “nem tanto ao mar, nem tanto à terra” faz muito sentido. No texto, o crítico questiona os poderes sobrenaturais de Paul _ele próprio causando mais ridículo do que a situação em si.

Nosso amigo não percebeu que se trata de uma brincadeira divertida, com altíssimo potencial de audiência, mas que não deveria ter qualquer tipo de explicação. Procurar biólogos para explicar os “dons” de Paul, é verdade, também é estúpido (sim, o jornalismo fez isso).

Há momentos em que tudo o que o jornalismo precisa é de uma feature. Isso mesmo, um tratamento lúdico a uma não notícia capaz de divertir a audiência. O diversionismo pelo diversionismo.

Mas tem gente que não compreende como o humor pode fazer bem à profissão.