A participação da “ex-audiência” no jornalismo (o principal assunto sobre a profissão agora e pelas próximas duas décadas) ainda é heterogênea e sem critérios.
Uma análise detalhada do site coreano Ohmynews, bastante citado como a experiência mais bem sucedida de jornalismo colaborativo, evidencia claramente que não há rumo. Às vezes, valoriza-se o diferencial para escancarar a alardeada ruptura com a grande imprensa (que doravante quero chamar de mainstream, posso?). Noutras, concorre-se pobremente com ela.
Projetos participativos em português, então, são ainda mais inanimados. O Wikinotícias, com média de oito textos (ou notas?) publicados por dia e administrado por cães de guarda de sua própria comunidade, ainda é inqualificável.
Estruturado de forma diferente (há a mediação profissional sobre o trabalho do amador), o Brasilwiki aparenta ter mais solidez. Porém sofre do mesmo mal do site asiático, sua confessa fonte de inspiração.
Ao anunciar, em sua fundação, que “cada cidadão é um repórter” e que sua plataforma era claramente uma oposição ao mainstream, o Ohmynews explicitou que manchetes como a desta madrugada são seu business.
No caso, um texto pessoal impressionista, com incômodo nariz de cera, mas um ótimo diferencial do noticiário da grande mídia: um cara contando que a cidade inglesa em que viveu, Dewsbury, tem o inacreditável poder de atrair tragédias. Foram vários os casos Isabella Nardoni no município. O mais recente (nem tão fresco assim, é do início de fevereiro…) é citado en passant pelo autor no oitavo parágrafo.
No dia em que as autoridades do Banco Mundial previram que a incontrolável alta dos preços dos alimentos vai provocar guerra e fome no mundo (NOTA: eram as manchetes de CNN e BBC por toda tarde/noite/madrugada deste domingo para segunda), não havia uma única notícia relacionada ao tema na trincheira do Ohmynews.
Tudo bem, se a missão da experiência é deixar de lado o hard news e incentivar sides ou análises.
Mas um passeio aleatório a outro setor do site, o canal de esportes, faz a incongruência saltar os olhos. É o caso do texto que conta as vitórias de Serena Williams e Nikolay Davidenko no Masters de Miami _ainda por cima publicado três dias após o fim do torneio.
Ou o relato da partida Colo Colo x Boca Juniors, com direito a descrição de lances e ficha técnica, tal qual centenas de outros produzidos pela grande mídia no mesmo dia.
Peralá: mas a colaboração é ou não é de hard news? É o que o usuário quiser, então? Cadê a mediação?
Aos experimentos pro-am de jornalismo colaborativo falta uma figura indispensável à tarefa profissional de coletar/filtrar/divulgar dados: a pauta, o roteiro de temas de interesse premente.
Um projeto que contemple a seleção de temas semanais/diários a serem abraçados pelos colaboradores, dentro de suas possibilidades, é factível. Quem não puder se comprometer a fazer, que não manifeste o desejo de desenvolver um texto. Agindo antes, os mediadores poderão obter resultados melhores.
De cara, isso é a solução para a vontade incontrolável de vestir um cachecol ao abrir sites como Ohmynews ou Brasilwiki, quase sempre dissociados do dia-a-dia em suas manchetes (mas, em suas listas de notícias, reféns dele).
E o papo ainda nem chegou à catastrófica colaboração oferecida pelos portais noticiosos.