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Perguntas sem resposta

“Nenhuma pergunta sem resposta”. A frase, uma espécie de mantra de quem gerenciou comunidades on-line no princípio dos 2000, foi por mais de um década uma espécie de regra não escrita do ofício de administrar a presença e a atuação de marcas e governos em serviços de redes sociais.

Da mesma forma que o avanço da tecnologia e a possibilidade de democratizar o acesso e a distribuição de notícias (por meio do que se habituou chamar de jornalismo participativo), acreditou-se que efetivamente estávamos ingressando numa era da história da humanidade onde todos, graças a dispositivos ao alcance das mãos, transformaríamos o mundo num lugar melhor e mais justo para se viver.

Um mundo em que as pessoas estariam realmente interessadas em compartilhar experiências, em trazer a público indagações legítimas, em registrar fatos do dia a dia sem viés, em fazer parte de comunidades simplesmente por acreditar e querer pertencer, por algum motivo, a um grupo específico.

Nesse cenário, “nenhuma pergunta sem resposta” era a senha para as marcas que tinham decidido descer para o play e brincar. Se você não agisse como um pitbull das redes sociais, perseguindo os usuários em busca de mais um check no gerenciamento de comunidade, estava fazendo aquilo errado.

Mas a era da inocência acabou. O jornalismo participativo se converteu numa voz enviesada e no núcleo principal da distribuição de notícias falsas, e a pressão pela interatividade total se mostrou um equívoco. O motivo: infelizmente as pessoas não tinham só boas intenções ao se relacionar com as marcas. Associado a isso, funcionalidades como a possibilidade de edição de comentários (presente em Facebook e Instagram) transformaram a área de comentários num perigoso e pantanoso terreno.

É triste, mas não é o fim: por óbvio existe (ainda bem!) legitimidade na maior parte dos relacionamentos digitais, mas é evidente que o fim da era da inocência precisou trazer, embutida, uma reorientação estratégica para fugir das cascas de banana que o tempo todo são jogadas para que marcas e governos escorreguem. Assim como a notícia falsa, há a interação falsa, enviesada e com objetivos nada edificantes.

No mundo digitalm, algumas perguntas podem (e devem) ficar sem resposta.

Ferramentas para ensinar a combater fake news

Imperdível: curadoria mundial feita pela plataforma argentina Chequeado coloca no ar hoje, Dia Internacional do Fact-Checking, o acesso a cerca de 200 atividades (vídeos e planos de aula entre elas) para ajudar professores a ensinar seus alunos a chegar à verdade dos fatos, desmascarando boatos e fake news. Em português o conteúdo está a cargo da Agência Lupa.

Repito: imperdível.

Notícias falsas, mas não tão críveis

Estudo de Andrew Guess, Brendan Nyhan e Jason Reifler antecipado pela primeira edição da revista New Yorker em 2018 demoliu mais um mito: o de que as notícias falsas distribuídas via redes sociais em 2016 foram preponderantes para a inesperada (até por ele mesmo) vitória de Donald Trump, enfim eleito o presidente 45 dos Estados Unidos.

Combinando dados de tráfego da internet um mês antes e uma semana depois da eleição a uma entrevista com 2.525 pessoas, o levantamento conclui que 27,4% dos americanos a partir dos 18 anos se depararam com ao menos uma notícia falsa relacionada ao pleito em suas timelines.

A questão é que quase 60% das visitas a sites disparadores de fake news partiu da parcela de 10% que se encontra em posições extremas – à direita ou à esquerda – do espectro político e, portanto, já têm opinião formada.

Uma pesquisa anterior, de Hunt Allcott e Matthew Gentzkow, já havia detectado que cada americano adulto foi impactado por pelo menos uma notícia falsa durante a eleição – entretanto, apenas 8% desse universo acreditou de fato no que estava lendo.

Uma outra descoberta interessante de Guess, Nyhan e Reifler diz respeito aos serviços de checagem de notícias (conhecidos como ‘fact-checkers’). De acordo com o estudo, só grandes consumidores de notícias (logo, pessoas muito bem informadas) costumam ler as verificações disponibilizadas pelos fact-checkers – o que significa que eles não prestam o serviço mais relevante, que é esclarecer os incautos.

Há ainda uma questão importante sobre as fake news e que acabou tangenciada depois que veio à tona a participação russa no que se pode chamar de manipulação da eleição: a notícia falsa impulsionada pelas redes sociais não nasce como tentativa de interferir num processo eleitoral, mas sim com cunho totalmente monetarista – mais visitas representam mais clicks em banners e, portanto, mais remuneração de serviços como o Google Ads.

Desta forma, o recurso não é (principalmente não é, insisto nisso) uma estratégia de pessoas interessadas em influenciar num processo eleitoral, mas sim em anabolizar sua conta bancária. Pense nisso nesse 2018 antes de sair clicando em links por aí.

Notícias falsas, outro calcanhar de Aquiles do Facebook

Não é somente o absurdo controle do que as pessoas veem, mas a responsabilidade de evitar que notícias falsas circulem dentro do Facebook. Eis a nova fronteira do questionamento ao maior serviço de rede social do mundo – justiça seja feita, obviamente nem o Google está sujeito a se livrar desse triste papel.

Ao Gizmodo a empresa nega que tenha desenvolvido métodos para impedir a disseminação de boatos a não ser a autodeclaração de usuários que se sintam ofendidos por um conteúdo específico. Também, para seu criador a falsidade responde por mero 1% do conteúdo postado no site.

O tema, evidente, ganhou força após a eleição de Donald Trump, quando a rede chegou a ser considerada ‘culpada’ pelo resultado.

A verdade, infelizmente, está em nós: no ramo das notícias, sensacionalismo e bobagens sempre terão mais engajamento do que jornalismo sério e acurado. Culpe os seres humanos.