Há autoelogio, incompreensão, incorreção e, pior, indigência científica nas belas palavras de Caio Tulio Costa na newsletter Jornalistas&Cia sobre a qual falei na semana passada.
Caio Tulio dispensa apresentações: é um dos pioneiros do jornalismo on-line no Brasil e, antes disso, foi um dos pilares do projeto que levou a Folha de S.Paulo ao posto de principal diário impresso brasileiro, tudo nos anos 90.
Em 2010, coordenou a campanha de Marina Silva (PV) à Presidência, da qual ela saiu eliminada no primeiro turno com mais de 19 milhões de votos.
Desde então, Caio preparou uma apresentação em que sustenta que seu trabalho e o de sua equipe levaram o pleito para o segundo turno, num cenário em que Dilma Rousseff, enfim eleita na rodada final, beirou 47% dos sufrágios no momento do primeiro voto.
Nem as pessoas que trabalharam para eleger Barack Obama se sentem à vontade em dizer que “A internet fez Obama ganhar”, embora o sociólogo espanhol Manuel Castells defenda que, sem a rede, o presidente americano não ganharia.
Lembre-se que o SMS, o torpedo que por aqui é caríssimo e foi pouco utilizado por motivos óbvios, jogou um papel importante na disputa nos EUA.
Logo, ao se refletir sobre o caso brasileiro, sugiro considerar vários ingredientes. O prato principal depende da soma deles e da existência de um bom candidato, claro.
Daí a se ter uma percepção alentada do que houve depende de levantamento científico criterioso.
Caio Tulio, por exemplo, ignora o “jornalismo tradicional”, que flagrou a principal assessora de Dilma (furo de Veja, depois complementado pela Folha), matérias que propiciaram a queda de Erenice Guerra e da própria presidente eleita na reta final da campanha, como mostra uma animação bacana que fizemos relacionando pesquisas e notícias.
“Muito pouca coisa vinda da mídia clássica surpreendeu leitores, telespectadores, ouvintes ou internautas, levando-os a ter de fato uma visão mais consistente de tudo o que estava acontecendo no País, nesse campo, no período eleitoral”, escreve ele.
Ainda que “pouca”, a contribuição do jornalismo impresso foi definitiva. Uma ministra caiu, e o jogo eleitoral se modificou.
Não que a internet não tenha tido sua parcela de contribuição para uma votação que parecia decidida: o debate sobre o aborto _o momento mais torpe em anos nos processos eleitorais brasileiros_ revelou o lado B da rede, quando se disseminaram boatos e mentiras (em áudio, comento esta prática existente desde o princípio da humanidade).
“De um modo geral, os principais veículos, mesmo sem ficar necessariamente a favor do candidato José Serra, foram muito críticos em relação à candidata Dilma Roussef. E o resultado foi que Dilma se elegeu, a despeito dessa cobertura crítica”, argumenta Caio.
Claro, mas houve o segundo turno, exatamente o fator creditado à internet por ele. E, como vimos, mídia tradicional e publicação pessoal, mais engajamento na rede, tiveram participação nisso.
Dissociá-los dependeria de uma pesquisa muito bem conduzida, não apenas da opinião de um ou de outro.
O coordenador de Marina diz que se a mídia estivesse “atenta, antenada, teria percebido com nitidez os sinais emanados das redes sociais”, coisa que se sabia desde o princípio, no caso de Marina, e que concretamente tinha provocado um Plinio de Arruda de impacto _o candidato do PSOL causou buzz na web ao aparecer na TV, mas foi apenas isso.
Uma dúvida que não tenho sobre processo é que a internet, aproveitando um slogan eleitoral famoso, pode mais.
PS – Propositadamente dou links a vários textos e áudios de minha autoria durante 2010 para que possamos confrontar, afinal de contas, o que eu opinava na época