
A lacônica nota da Gol, que se recusou a prestar mais esclarecimentos
O incidente do urubu tragado pela turbina esquerda do Boeing 737 que operava no dia 10 de março de 2009 o voo Gol 1244, entre Congonhas e Porto Alegre, voltou a bater em minha porta.
Agora porque a crônica na qual relatei a quase tragédia foi parar num fórum de discussão de pilotos, aeronautas, aeroportuários e simpatizantes (atenção: só para cadastrados, mas se você gosta do assunto e quer monitorar ou trocar informações com insiders, vale bem a pena).
Foi uma terça-feira (esta, como aquela) bem agitada por conta disso, quando mais uma vez vivenciei de forma prática e presencial que esse papo de era da conversação sobre o qual tanto tenho conversado com colegas e alunos está longe de ser algo a longo prazo _pelo contrário, já é real e transcorre diariamente diante de nossos olhos.
Recapitulando: notei uma afluência grande de tráfego ao Webmanário vinda do tal fórum. Lá, encontrei duas mensagens que diziam respeito diretamente a mim.
QUOTE(pilot81 @ Mar 16 2009, 09:31 AM) * Semana passada(terça feira) eu estava de extra para POA e tivemos um bird strike na dep. em CGH. Após varias orbitas o cmte. optou por prosseguir ao destino. O avião passou o dia inteiro em manutenção em POA. Vibration em 3,8 na subida… Deu até na Zero Hora no outro dia.
QUOTE(Rafaelguimaraes @ Mar 16 2009, 10:31 PM) * Olá, teve até um jornalista que estava a bordo e que decidiu publicar em seu blog. https://webmanario.wordpress.com/2009/03/11…ia-do-voo-1244/
Bird strike, vibration… enfim, era o público (sim, o público também apura/relata/analisa/difunde notícias) complementando uma informação que eu tinha dado aqui dias antes _mas porque estava dentro desse avião que, agora, era objeto de comentários. Óbvio que fiquei louco para saber o que significava uma vibration 3,8…
Entrei no fórum para dialogar com esse povo. É tudo o que eu sugiro para um jornalista: que corra atrás de sua audiência, tente entendê-la, seja próximo dela e, principalmente, leve suas observações em conta.
Descobri que o limite recomendado pelo fabricante da turbina do Boeing 737 é vibration 4,0 _ou seja, estivemos de fato à beira de um colapso (vibration é isso mesmo, a trepidação da peça). Mais: que o choque contra pássaros em aeroportos, que há tempos é assunto antigo, está ultrapassando a barreira do “eventualmente acontece” (de novo, área restrita aos cadastrados do fórum).
Segui pesquisando e encontrei a informação (devidamente compartilhada com o público) de que o aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, já estava usando aves predadoras _no caso, gaviões_ para espantar famílias de pássaros nos arredores. “Apesar de terem começado em aeroporto errado, é um avanço”, foi uma das respostas.
Soube ainda que grandes aeroportos no mundo têm departamento de biologia, que estuda o ecossistema e intervenções possíveis em casos concretos de ameaça à segurança aérea.
Daí o caldo da conversação engrossou.
QUOTE(Boeing737 @ Mar 17 2009, 05:44 PM) * Olá Alec, li seu relato e como profissional do meio achei um pouco sensacionalista como de costume, mas até entendo por se tratar de uma pessoa leiga no assunto.
Ponderei que “de leigo certamente, sensacionalista não. Eu estava dentro do avião. Não estou dizendo o que me contaram, mas o que vivenciei”. Logo, outro usuário voltaria à carga.
QUOTE(Lear_60 @ Mar 17 2009, 07:08 PM) * Desculpe, mas a sua afirmação não condiz em nada com o seu texto. A começar pelo título: “Jornalista até na hora da morte: a quase tragédia do voo 1244” No texto várias vezes o tom de drama não condiz com a sua afirmação de não ser sensacionalista, muito pelo contrário. É bastante compreensível que por não entender o que estava se passando, o medo e apreensão se fizessem presentes mas ao relatar os fatos, as palavras utilizadas e o tom em que o texto foi escrito é possível notar uma bela dose de sensacionalismo, pra Datena nenhum botar defeito.
Até de Datena (ou ainda melhor que ele) fui chamado!!! É nessa hora que há um conflito quase insuperável entre jornalista e cidadão. Afinal, se estava claro que o repórter era leigo, ficou nítido que o público, especialista em aeronaves, não sabia nada de jornalismo.
Confundiu-se uma crônica publicada num blog com uma notícia de jornal. Ou seja: para essa audiência, o simples fato de ser jornalista significava que um texto seu, qualquer texto seu, tinha o mesmo valor de uma notícia.
É um ruído tremendo, mas a interação que rolou antes disso paga qualquer prenda. Porém fica escancarado o abismo. E cabe a nós nos aproximarmos.
Por ora, a conversa a parou no comentário “Acho louvável a atitude de vir até um fórum como esse e pedir informações para entender o que se passou, mas escrever um texto como esse, só reforça a imagem que todos temos de que os profissionais do jornalismo adoram aumentar absurdamente os fatos envolvendo aviação.”
PS – Procurei a assessoria de imprensa da Gol que, burocrática, limitou-se a reenviar nota produzida sob demanda e se negou a prestar outros esclarecimentos sobre o voo 1244. É a imagem que se vê no início deste post.