Falo com alguma frequência, em sala de aula e rodas de amigos, sobre o CQC, mas aqui no Webmanario a atração da Band foi tratada de forma quase tangencial. Até mais uma polêmica envolvendo coleguinhas e um personagem do programa.
Antes de tudo, você precisa saber o que eu acho de programas televisivos tipo CQC: não se trata de jornalismo, é humorismo mimetizando a linguagem jornalística, o que pode, com sorte, até virar jornalismo.
Não estamos diante de repórteres, mas de personagens brifados para a zombaria. Pior, eles confundem consumidores de notícias, que volta e meia se perguntam por que os jornalistas “tradicionais” não são tão despojados e combativos nas entrevistas do dia a dia.
Simplesmente porque não são humoristas, cara-pálida.
Fazendo-se essa separação entre as duas profissões, não vejo grandes problemas na liberação do acesso do CQC ao ambiente profissional jornalístico (é o último privilégio da imprensa tradicional: a legitimidade de ter acesso aos protagonistas do noticiário, como o vestiário após os jogos).
O que não é legal é o humorismo atrapalhar o bom desenvolvimento do jornalismo. Aí a coexistência deixa de ser pacífica – e chamar os caras pra porrada, como no caso citado lá no começo do texto, é compreensível.
E, a julgar pelos números de audiência, a fórmula está pra lá de desgastada…
ATUALIZAÇÃO: Nos comentários, nosso colega Sergio Leo (que testemunhou a confusão com o CQC em Brasília) dá um importante depoimento.
Caro, estava no lance, não vi ninguém chamar os caras para a porrada, versão divulgada no blog deles. Vi e ouvi, sim, o produtor deles gritando palav~rões e ameaçando briga.
O acesso legítimo a protagonistas do noticiário não é privilégio, é necessidade. E jornalistas o perdem, quando abusam, comportando-se de maneira não profissional, usando o acesso para outra coisa que não buscar notícia (seja para discutir, brigar, zoar, pedir favor).
Misturar jornalismo e circo é divertido para o circo (o espectador olha aquele monte de idiotas bem comportados e o “esperto” fazendo da cerimônia uma piada e pensa: “caramba, só aquele cara teve coragem”). É muito fácil criar polêmica e espanto rompendo as regras. Imagine alguém entrando no estúdio do CQC com piadinhas de mau gosto sobre a filha homossexual do Marcelo Tas, ou sobre como os caras rifaram o Rafa Bostas quando ameaçou prejudicar os anunciantes (únicos que nunca serão alvo do “jornalismo” dos caras. Capaz de ter quem achasse graça (eu não). Pois é, não dá, mesmo humorista precisa de ambiente regulado, organizado, para fazer seu trabalho.
Essas intervenções atrapalham os profissionais (o sujeito nesse episódio, melou, berrando babaquices como “Hillary, I love you” o stand up de uma repórter, que aproveitava a imagem para o jornal da noite; e o tempo estava apertadíssimo, a coisa foi super tarde); e, depois, melaram a tentativa dos fotógrafos de pegar algo interessante na saída da coletiva. Pior: com esses comportamentos, as autoridades, que têm medo do bullying dos caras, dão credencial a eles e limitam cada vez mais o acesso dos verdadeiros repórteres às fontas das notícias, temerosos de alguma palhaçada.
O Marcelo Tas, no tempo do Olhar Eletrônico (e, vá lá, algumas pautas do próprio CQC) sabiam fazer jornalismo, perguntas ionconvenientes mostrando facetas inesperadas. Mas não é isso o que faz a maioria dos sujeitos lá; fazem bullying (não tinham coisa mais divertida a perguntar a Hillary que comentar que foi traída pelo marido e insinuar que, se saiu para se divertir na Colômbia, tinha de sair dando por aí para se vingar?); mas, quando a fonte é amistosa chegam a descer ao mais baixo puxasaquismo, de envergonhar o jornalista mais picareta. Na última segunda, a grande matéria do sujeito em Cartagena foi penetrar na sala da conferência (coisa que bons jornalisats fazem com frequencia, mas para sacar notícia) e dar tchauzinho para Dilma, o que comemorou no ar, de forma patética.
O CQC tem direito de fazer o que considera ser humor, mas não tem por que alguém legitimar o disfarce de jornalista que eles querem impor. Se querem fazer palhaçada, lutem pelo crachá de palhaço e acesso aos eventos. Mas devidamente identificados como humoristas para adolescentes que são.
Sergio, obrigado pela visão da polêmica em questão e por seus insights sobre o tema como um todo. Concordo absolutamente com tudo. É patético, mas é um direito. Desde que não invada o espaço profissional de quem trabalha com seriedade.
abs
O pior é ver muitos alunos admirando o CQC e achando que essa é a vanguarda do jornalismo, que isso é lutar pelo interesse público.
Exatamente, Träsel, é o que mais me incomoda. Essa mimetização do jornalismo consegue, por vários momentos, iludir as pessoas.
abs
E eles posam de vítima quase sempre, falando que é censura, ataque à liberdade de expressão, blá, blá, blá. Não se trata disso. É que realmente não dá para misturar no mesmo espaço quem está para fazer “humor” e quem, legitimamente, está fazendo jornalismo. Concordo integralmente com o colega Sergio Leo.
É isso, Tatiana. Nada contra o humor, mas não podemos permitir que essa atividade seja confundida com jornalismo.
bjs
A fórmula “Ernesto Varela” funcionava lindamente nos anos 80, numa época de transição entre a censura braba e o oba-oba da abertura política. Hoje não há clima pra isso. O que o CQC faz é puro esculacho, e é disso que o Brasil menos precisa, se quer se tornar um país sério de fato.
Milton, ainda acho que tudo é questão de “quadrado”: se não invadir o nosso, o humor é sempre bem-vindo…
Concordo com todos. Cheguei a ver o primeiro e o segundo programas na época da estreia , depois larguei pra lá, vi que não acrescentaria em nada. Abraços!
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