A Economist photoshopou Obama, e daí?

A capa de 19 de junho da The Economist, revista noticiosa mais importante do mundo (e das poucas que só ganham leitores com o passar do tempo), provocou furor ao descobrir-se, via The New York Times, que a publicação alterou uma fotografia em que o presidente Barack Obama aparecia cabisbaixo ao lado de mais duas pessoas tendo como fundo plataformas petrolíferas _imagem ideal (a alterada, claro) para ilustrar uma reportagem sobre o desastre ambiental de responsabilidade da petrolífera britânica BP em solo americano e suas implicações políticas.

É um pecado menor, e peço aqui que me entendam. Repórteres-fotográficos talvez jamais entenderão (há aquele consenso de que fotografia é obra de arte e não pode ser editada), e fui instado a falar sobre isso por Gustavo Roth, editor-adjunto de Fotografia da Folha de S.Paulo, que sempre colabora com o Webmanario.”Se queimaram feio, hein…?”, me disse Roth, ele próprio antenadíssimo no que rola nos meandros de nossa profissão, seja aqui, nos EUA ou no Uzbequistão.

Vou ser polêmico agora: será? Não acho, mas não acho mesmo. Há, claramente, um erro, mas que embute uma tentativa de acerto. Aliás, Pedro Dias Leite, o homem que faz o caderno Poder da Folha fechar na hora e fechar bem, tinha me avisado um pouco antes da história _compartilhando a visão de que o episódio está longe de ser o maior absurdo do jornalismo moderno.

Talvez a mesma representação com um trabalho de arte em cima (uma estilização impressionista ou pop, sei lá) resolveria a coisa sem questionamentos filosofais que, na verdade, só nós jornalistas temos.

Photoshopado, Obama estava lá e continua lá, cabisbaixo, com uma plataforma de petróleo no Golfo do México como cenário de fundo. Excluíram-se personagens menores _literalmente, como a presidente da Câmara de representantes de uma cidade da Louisiana e uma autoridade local da Guarda Costeira já eliminada no corte do fotograma.

Impossível pensar em fazer uma coisa dessas sem supor que irão descobrir: a foto em questão, tirada em 28 de maio, é de um fotógrafo da agência Reuters, Larry Downing, e provavelmente foi distribuída para todo o mundo.

Eu não faria isso desse jeito numa publicação noticiosa, mas faria, sim, propondo um trabalho de ilustração sobre foto, pra se livrar de uma vez por todas da capivara do “alterar a realidade”, que no final das contas pauta o debate e de quem é muito difícl se desvencilhar.

Mas a capa mexida, no final das contas, não escondeu o Obama triste e enrolado tendo ao fundo o motivo de suas preocupações.

10 Respostas para “A Economist photoshopou Obama, e daí?

  1. Qual a altura do Obama? Lógico que um afro de quase 1,80m precisa estar cabisbaixo para conversar com uma mulher de 1,50m. Trocou o sentido; trocou de foto. Fizerem a imagem parecer uma foto que não conseguiram fotografar. Avacalharam.

  2. Não dá pra ver diretamente daqui, mas parece que realmente ele tá desanimado com a situação, já que está na beira de uma praia (é isso?). Acho que se a foto fosse publicada no original também passaria a impressão que a Economist quis passar com a “zoomzada” na imagem

  3. Discordo. A foto original mostra Obama ouvindo a assessora. Na foto alterada, ele parece estar desolado, cabisbaixo. Há uma clara diferença de tom na imagem. Se a Economist queria ‘interpretar’ a foto, deveria ter feito um desenho baseado na foto – o que aliás, o faz com maestria.

    Se vc aceita a alteração dessa foto, pq nao aceitar também as feitas na antiga União Sovietica?

    • Jorge,

      Não disse que aceito, tanto que indiquei que faria de outra maneira (a sugestão dada foi uma representação artística, um trabalho gráfico em cima). Exatamente a opção pelo desenho que você sugeriu. O ponto é a proporção do escândalo, que me pareceu desmedido.

      abs

  4. Uma coisa que acho engraçada toda vez que surge uma dessas polêmicas envolvendo fotografias é o seguinte: jornalistas de texto podem “melhorar” as aspas dos entrevistados, mas qualquer alteração em uma foto é considerada um pecado mortal.

    • Gabriel,

      É o meu ponto. Tratou-se de mais um erro, mas não DO erro. Agora, “melhorar” as aspas dos entrevistados não pode, né?

      abs

      • Gabriel Ferreira

        Também acho que não pode, mas é só ler uma mesma notícia em dois veículos para notar que isso acontece.

      • alecduarte

        Gabriel,

        Te diria que muitas vezes isso ocorre (e ocorre mesmo) por falta de capricho na transcrição das declarações. No meio on-line, então, é uma dificuldade: muitas vrzes reporta-se interpretando, não relatando. E fora a ponta de cá, de quem recebe a info, contribuindo com sua distorção involuntária.

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