Essa é muito boa para a pequena coleção de argumentos dos que costumam desvalorizar o jornalismo cidadão por uma suposta falta de credibilidade: no domingo, o iReport, espaço colaborativo da CNN, deixou passar uma história sobre Randall Stephenson, CEO da AT&T, que teria sido encontrado morto em sua “mansão multimilionária”.
Era mentira, um trote, mas o mais curioso é que a AT&T (provedor de acesso à web mais utilizado nos Estados Unidos) tomou suas próprias providências e bloqueou um dos fóruns mais movimentados da web americana na qual a informação já bombava e era debatida com fervor (do iReport a “notícia” foi excluída rapidamente).
Não foi a primeira vez que o iReport foi ludibriado por, digamos, engraçadinhos.
Evidente que a possibilidade de trotes não é uma exclusividade da era da conversação e altíssima tecnologia _eu vou voltar no tempo só até 1983, quando internet era um termo usado apenas por militares e alguns acadêmicos, para citar o caso Boimate, no qual a revista Veja foi enganada por uma brincadeira de 1º de abril.
São inúmeros esses “descuidos” editorais que remontam, certamente, à própria época de Gutemberg.
Não têm a ver, portanto, com a produção colaborativa de notícias. Mas é sempre bom repetir e reforçar, porque senão vai aparecer gente dizendo “tá vendo? eu sabia!”.
Isso não exclui a possibilidade de se fazer uma reflexão sobre qual o melhor processo de inserção do público dentro do noticiário.
O iReport, como se sabe, não possui moderação nem edição posterior, ou seja, as notícias ali publicadas (salvo se são mentirosas _mas de fácil checagem, convenhamos, senão jamais serão descobertas) não passam por qualquer jornalista profissional antes de ir ao ar.
Algumas, de tão boas, vão parar no site da CNN em pessoa (a empresa afirma que, até hoje, de quase 321 mil textos postados, 699 chegaram ao mainstream).
Pessoalmente, eu prefiro a mediação e a convivência pro-am, quer dizer, entre profissionais e amadores, o que dá origem ao jornalismo que conceituo como participativo _ou seja, o público efetivamente está participando de um processo. Falamos mais disso em breve.
A primeira frase “Essa é muito boa para a pequena coleção de argumentos dos que costumam desvalorizar o jornalismo cidadão por uma suposta falta de credibilidade” é suficiente pra resumir o que eu penso.
🙂
E o comprometimento dos grandes meios com os grandes anunciantes e políticos tb.
Saludos y gracias,
Isabela.
Sim, Alec, eu também prefiro a convivência pro-am. Acho que o jornalismo, para ser colaborativo de verdade, tem que contar com a participação destes dois grupos. Senão é conteúdo individual, nada “CO”, entende?
Sendo essa a segunda vez (que eu sei) que o iReport “mata” alguém desonestamente – a primeira foi o Steve Jobs, né? -, não seria o caso da CNN rever sua política editorial para o canal?
beijocas!
Ana,
Concordo contigo e é por isso que, inspirado por alguns escritos de Axel Bruns, deixei de usar jornalismo cidadão como sinônimo de colaboração/participação. Nestes, está embutida a inserção num processo. Um jornalista cidadão simplesmente relata fatos, em suas esferas de publicação pessoal, enquanto no jornalismo participativo (ou colaborativo) esse mesmo cidadão toma parte efetivamente da construção do noticiário.
Sobre o iReport: sim, antes tinha sido Jobs. É por isso que eu insisto tanto nessa tese do pro-am. O jornalismo dito ‘profissional’ não pode escancarar as suas portas para quem seja. Tem uma responsabilidade enorme. Mas a lição parece não ter sido aprendida.
bjs